Seres Tupy (Ney Matogrosso/ Pedro Luís e a Parede)
Seres ou não seres
Eis a questão
Raça mutante por degradação
Seu dialeto sugere um som
São movimentos de uma nação
Raps e Hippies
E roupas rasgadas
Ouço acentos
Palavras largadas
Pelas calçadas sem arquiteto
Casas montadas, estranho projeto
Beira de mangue, alto de morro
Pelas marquises, debaixo do esporro
Do viaduto, seguem viagem
Sem salvo conduto é cara a passagem
Por essa vida, que disparate
Vida de cão, refrão que me bate
De Porto Alegre ao Acre
A pobreza só muda o sotaque
Lá vem a Cidade (Lenine/Bráulio Tavares)
EU VIM PLANTAR MEU CASTELO
NAQUELA SERRA DE LÁ,
ONDE DAQUI A CEM ANOS
VAI SER UMA BEIRA-MAR...
VI A CIDADE PASSANDO,
RUGINDO, ATRAVÉS DE MIM...
CADA VIDA
ERA UMA BATIDA
DUM IMENSO TAMBORIM.
EU ERA O LUGAR, ELA ERA A VIAGEM
CADA UM ERA REAL, CADA OUTRO ERA MIRAGEM.
EU ERA TRANSPARENTE E ERA GIGANTE
EU ERA A CRUZA ENTRE O SEMPRE E O INSTANTE.
LETRAS MISTURADAS COM METAL
E A CIDADE CRESCIA COMO UM ANIMAL,
EM ESTRUTURAS POSTIÇAS,
SOBRE AREIAS MOVEDIÇAS,
SOBRE OSSADAS E CARNIÇAS,
SOBRE O PÂNTANO QUE COBRE O SAMBAQUI...
SOBRE O PAÍS ANCESTRAL
SOBRE A FOLHA DO JORNAL
SOBRE A CAMA DE CASAL ONDE EU NASCI.
EU VIM PLANTAR MEU CASTELO
NAQUELA SERRA DE LÁ,
ONDE DAQUI A CEM ANOS
VAI SER UMA BEIRA-MAR...
A CIDADE
PASSOU ME LAVRANDO TODO...
A CIDADE
CHEGOU ME PASSOU NO RODO...
PASSOU COMO UM CAMINHÃO
PASSA ATRAVÉS DE UM SEGUNDO
QUANDO DESCE A LADEIRA NA BANGUELA...
VEIO COM LUZES E SONS.
COM SONHOS MAUS, SONHOS BONS.
FALAVA COMO UM CAMÕES,
GEMIA FEITO PANTERA.
ELA ERA...
BELA... FERA.
DESTA CIDADE UM DIA SÓ RESTARÁ
O VENTO QUE LEVOU MEU VERSO EMBORA...
MAS ONDE ELE ESTIVER, ELA ESTARÁ:
UM SERÁ O MUNDO DE DENTRO,
SERÁ O OUTRO O MUNDO DE FORA.
VI A CIDADE FERVENDO
NA EMULSÃO DA RETINA.
CREPITAR DE VIDA ARDENDO,
MARIPOSA E LAMPARINA.
A CIDADE ENSURDECIA,
RUGIA COMO UM INCÊNDIO,
ERA VENENO E VACINA...
EU VIM PLANTAR MEU CASTELO
NAQUELA SERRA DE LÁ,
ONDE DAQUI A CEM ANOS
VAI SER UMA BEIRA-MAR...
EU PAIRAVA NO AR, E OLHAVA A CIDADE
PASSANDO VELOZ LÁ EMBAIXO DE MIM.
ERAM DEZ MILHÕES DE MENTES,
DEZ MILHÕES DE INCONSCIENTES,
SE MISTURAM... VIRAM ENTES...
OS QUAIS CONDUZEM AS GENTES
COMO SE FOSSEM CORRENTES
DUM RIO QUE NÃO TEM FIM?
ESSE RUÍDO
SÃO OS SÉCULOS PINGANDO...
E AS CIDADES CRESCENDO E SE CRUZANDO
COMO CÍRCULOS NA ÁGUA DA LAGOA.
E EU VI NUVENS DE POEIRA
E VI UMA TRIBO INTEIRA
FUGINDO
PISANDO
GANHANDO UMA RIBANCEIRA...
E A CIDADE VINHA VINDO,
A CIDADE VINHA ANDANDO,
A CIDADE INTUMESCENDO:
CRESCENDO... SE APROXIMANDO.
EU VIM PLANTAR MEU CASTELO
NAQUELA SERRA DE LÁ,
ONDE DAQUI A CEM ANOS
VAI SER UMA BEIRA-MAR...
Rua da Passagem (Trânsito)
(Lenine/Arnaldo Antunes)
Os curiosos atrapalham o trânsito
Gentileza é fundamental
Não adianta esquentar a cabeça
Não precisa avançar no sinal
Dando seta pra mudar de pista
Ou pra entrar na transversal
Pisca alerta pra encostar na guia
Pára brisa para o temporal
Já buzinou, espere, não insista,
Desencoste o seu do meu metal
Devagar pra contemplar a vista
Menos peso do pé no pedal
Não se deve atropelar um cachorro
Nem qualquer outro animal
Todo mundo tem direito à vida
Todo mundo tem direito igual
Motoqueiro caminhão pedestre
Carro importado carro nacional
Mas tem que dirigir direito
Para não congestionar o local
Tanto faz você chegar primeiro
O primeiro foi seu ancestral
É melhor você chegar inteiro
Com seu venoso e seu arterial
A cidade é tanto do mendigo
Quanto do policial
Todo mundo tem direito à vida
Todo mundo tem direito igual
Travesti trabalhador turista
Solitário família casal
Todo mundo tem direito à vida
Todo mundo tem direito igual
Sem ter medo de andar na rua
Porque a rua é o seu quintal
Todo mundo tem direito à vida
Todo mundo tem direito igual
Boa noite, tudo bem, bom dia,
Gentileza é fundamental
Pisca alerta pra encostar na guia
Com licença, obrigado, até logo, tchau.
A todas as comunidades do engenho novo (o Rappa)
(Falcão/Zandão)
Eu moro na comunidade do Engenho Novo
À todas as comunidades do Engenho Novo
Tenho referencial para chegar no
Bairro então
Souza Barros 24 e a Marechal Rondon
Tem Buraco do Padre para quem
Quiser passar
Tem igreja Conceição para quem
Quiser rezar
À todas as comunidades do Engenho Novo
Eu moro na comunidade do Engenho Novo
Em todo lugar pela-saco tem
No Engenho não é diferente
Tem pela-saco também
Pra não parecer que é marra minha,
Meu irmão no Engenho tem gente fina
Gatinha e sangue bom
Todo mundo diz que o funqueiro
É um animal
Pela-saco falador tem tudo que
Tomar um pau
Quando chega a tarde a sensação
É o futebol
E a noite com a gatinha
Curtir um baile na moral
É, a todos os bailes eu quero agradecer
Tem Sargento, Magnatas e também
o Garnier
Céu Azul, Matriz, Rato Molhado, Jacaré,
São João, Mangueira, Sampaio, fiquei na fé
Cabeça feita em casa ou em qualquer lugar
Pra quem gosta do assunto vamos
Logo "shapear"
Quando chega a tarde
No Parque Santos Dumont
Pra quem não conhece o Engenho
Tá convidado sangue bom
Eu moro na comunidade do Engenho Novo,
À todas as comunidades do Engenho Novo
Partideiro que é partideiro não
Pode vacilar
Quando entra no samba tem
Que versar
Quando entra no samba
Não pode ficar de blá-blá-blá
Muitas pessoas vão se
Influenciar
E vão falar pra você
Não aparecer mais por lá
Só que a questão
Camarada sangue bom
É tudo sem interesse
É tudo de coração
Quem fuma, quem fuma,
Quem bebe, quem cheira
Tem que chegar no sapatinho
E não ficar de bobeira
Porque quem está lá
Não
Está de olho no movimento
Está de olho na situação
Quem está lá
Não
Está ligado no movimento
Está ligado na situação
Morteiro na mão,
Estrondo no ar
Avisando que a polícia
Qualquer hora vai chegar
O morro amado
Ao mesmo tempo temido
Do comandado por irmãos
Comandado por amigo
Só que a questão
Camarada sangue bom
É tudo sem interesse
É tudo coração
Como já dizia Cartola
As rosas não falam
Se eles choram
Por que é que eu vou chorar
Eu vou me emocionar
Quando a minha escola
Na avenida entrar
Mostrando ao mundo
O que eu quero ver
Como já dizia Renatinho,
Valtinho, Cotoco
É mangueira verdadeira
Área de lazer
Quarta e sexta-feira
Rola o futebol
O morro desce
Pra
A regra aqui uma falta
Não existe
Se não gostou vacilão
Fica de fora e assiste
É, eu moro lá, eu moro lá,
Engenho Novo, Engenho Novo
Favela (O Rappa)
Vá dizer pra ela que o curral do samba é a passarela,
vá dizer pra ela que o rio de janeiro todo é uma favela,
senhor, candeia, noel, cartola, adoniram
vá dizer pra ela que o rio de janeiro todo é uma favela,
vá dizer pra ela que o som que eu faço vem lá da favela,
me vem na memória as rodas de samba
é batuque na palma da mão
roda de samba de bamba
velha guarda, portela
velha guarda, mangueira
viola, jamelão
vá dizer pra ela que o curral do samba é a passarela,
vá dizer pra ela que o rio de janeiro todo é uma favela,
de madureira à sepetiba, passando por santa cruz,
bate bola de bixiga de boi
bate bola de sebo de bixiga de boi
é nos terreiros do samba
que a molecada cresce e ama sua escola
e faz as mãos e os pés sangrar
quando os anos passam
quando ele se emociona
de ver sua escola ganhar
tiro de misericórdia
Composição: Joao Bosco E Aldir Blanc
O menino cresceu entre a ronda e a cana
Correndo nos becos que nem ratazana.
Entre a punga e o afano, entre a carta e a ficha
Subindo em pedreira que nem lagartixa.
Borel, juramento, urubu, catacumba,
Nas rodas de samba, no eró da macumba.
Matriz, querosene, salgueiro, turano,
Mangueira, são carlos, menino mandando,
Ídolo de poeira, marafo e farelo,
Um Deus de bermuda e pé-de-chinelo,
Imperador dos morros, reizinho nagô,
O corpo fechado por babalaôs.
Baixou oxolufã com as espadas de prata,
Com sua coroa de escuro e de vício.
Baixou cão-xangô com o machado de asa,
Com seu fogo brabo nas mãos de corisco.
Ogunhê se plantou pelas encruzilhadas
Com todos seus ferros, com lança e enxada.
E oxossi com seu arco e flecha e seus galos
E suas abelhas na beira da mata.
E oxum trouxe pedra e água da cachoeira
Em seu coração de espinhos dourados.
Iemanjá, o alumínio, as sereias do mar
E um batalhão de mil afogados.
Iansã trouxe as almas e os vendavais,
Adagas e ventos, trovões e punhais.
Oxum-maré largou suas cobras no chão.
Soltou sua trança, quebrou o arco-íris.
Omulu trouxe o chumbo e o chocalho de guizos
Lançando a doença pra seus inimigos.
E nana-buruquê trouxe a chuva e a vassoura
Pra terra dos corpos, pro sangue dos mortos.
Exus na capa da noite soltara a gargalhada
E avisaram a cilada pros orixás.
Exus, orixás, menino, lutaram como puderam
Mas era muita matraca e pouco berro.
E lá no horto maldito, no chão do pendura-saia,
Zumbi menino lumumba tomba da raia
Mandando bala pra baixo contra as falanges do mal,
Arcanjos velhos, coveiros do carnaval.
- irmãos, irmãs, irmãozinhos,
Por que me abandonaram?
Por que nos abandonamos
Em cada cruz?
- irmãos, irmãs, irmãozinhos,
Nem tudo está consumado.
A minha morte é só uma:
Ganga, lumumba, lorca, Jesus
Grampearam o menino do corpo fechado
E barbarizaram com mais de cem tiros.
Treze anos de vida sem misericórdia
E a misericórdia no último tiro.
Morreu como um cachorro e gritou feito um porco
Depois de pular igual a macaco.
Vou jogar nesses três que nem ele morreu:
Num jogo cercado pelos sete lados.
Música Urbana 2
Composição: Renato Russo
Em cima dos telhados as antenas de TV tocam música urbana,
Nas ruas os mendigos com esparadrapos podres
cantam música urbana,
Motocicletas querendo atenção às três da manhã -
É só música urbana.
Os PMs armados e as tropas de choque vomitam música urbana
E nas escolas as crianças aprendem a repertir a música urbana.
Nos bares os viciados sempre tentam conseguir a música urbana.
O vento forte, seco e sujo em cantos de concreto
Parece música urbana.
E a matilha de crianças sujas no meio da rua -
Música urbana.
E nos pontos de ônibus estão todos ali: música urbana.
Os uniformes
Os cartazes
Os cinemas
E os lares
Nas favelas
Coberturas
Quase todos os lugares.
E mais uma criança nasceu.
Não há mais mentiras nem verdades aqui
Só há música urbana.
Yeah, Música urbana.
Oh Ohoo, Música urbana.
América do Sul
Composição: Paulo Machado
Deus salve a América do Sul
Desperta, ó claro e amado sol
Deixa correr qualquer rio
Que alegre esse sertão
Essa terra morena, esse calor
Esse campo, essa força tropical
Desperta América do Sul,
Deus salve essa América Central
Deixa viver esses campos molhados de suor
Esse orgulho latino em cada olhar,
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