domingo, 25 de outubro de 2009
ALGUMAS PALAVRAS SOBRE UMA LINGUAGEM
A LINGUAGEM SECRETA DO CINEMA
Jean-Claude Carrière
C3121 Carrière,Jean-Claude,1931-
A linguagem secreta docinema / Jean-
Claude Carrière ; tradução Fernando Albagli,
Benjamin Albagli. – Rio de Janeiro : Nova
Fronteira, 1995.
ISBBN 85-209-0651-6
Tradução de: The secret language of film
1. Cinema. 2. Cinema – Linguagem
1. Título.
CDD 791.43
CDU 791.43
INTRODUÇÃO
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ALGUMAS PALAVRAS SOBRE UMA LINGUAGEM
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Naquelas mesmas terras africanas, nos primórdios do cinema, quando os expectadores menos intransigentes abriam realmente os olhos para o novo espetáculo, mal podiam compreendê-lo.Mesmo quando reconheciam algumas das imagens de outro lugar – um carro, um homem, uma mulher, um cavalo-, não chegavam a associá-las entre si. A ação e a história os deixavam confusos. Com uma cultura baseada em rica e vigorosa tradição oral, não conseguiam se adaptar àquela sucessão de imagens silenciosas, o oposto absoluto daquilo a que estavam acostumados. Ficavam atordoados. Ao lado da tela, durante todo o filme, tinha que permanecer um homem, para explicar o que acontecia.Luis Buñuel ainda conheceu esse costume (que subsistia na áfrica na década de 50) em sua infância na Espanha, em torno de 1908 ou 1910. De pé, com um longo bastão, o homem apontava os personagens na tela e explicava o que eles estavam fazendo. Era chamado explicador. Desapareceu – pelo menos na Espanha – por volta de 1920.
Imagino que surgiam tipos como esse mais ou menos em toda parte. Porque o cinema criou uma nova – absolutamente nova –linguagem, que poucos espectadores podiam absorver sem esforço ou ajuda.
Bem no princípio, não era esse o caso (pelo menos é o que imaginamos). Nos primeiros dez anos, ainda era, apenas uma seqüência de tomadas estáticas, fruto direto da visão teatral. Os acontecimentos vinham, necessariamente, um após o outro, em seqüência ininterrupta, dentro daquele enquadramento imóvel, e podia-se acompanhar a ação bem facilmente. A primeira reação da platéia era de outro tipo: as pessoas tinham curiosidade de saber de que era feita aquela imagem em movimento; vendo nela uma espécie de nova realidade, buscavam a ilusão, o truque. Mas, depois da primeira surpresa, quando ficava claro que o trem dos irmãos Lumière não os ia esmagar, os espectadores rapidamente compreendiam a seqüência de acontecimentos, ordenados rolo a rolo, fictícios ou imaginários, que se expunham diante de uma câmera imóvel. Afinal, não era diferente do que acontecia no teatro, onde o palco era estático e claramente demarcado. Naquele quadro, personagens surgiam, encontravam-se e trocavam gestos ou, mais exatamente, sinais. Quando deixavam o campo de visão da câmera, era como se saíssem para os bastidores. E, como não tinham voz e (quase sempre) cor, eminentes cabeças concluíram que tudo aquilo era decididamente inferior ao teatro de verdade.
Não surgiu uma linguagem autenticamente nova até que os cineastas começassem a cortar o filme em cenas, até o nascimento da montagem, da edição. Foi aí, na relação invisível de uma cena com a outra, que o cinema realmente gerou uma nova linguagem. No ardor de sua implementação, essa técnica aparentemente simples criou um vocabulário e uma gramática de incrível variedade. Nenhuma outra mídia ostenta um processo como esse.
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